1 de Abril de 2022
Documento do mês de abril de 2022 – Guias e documentos de crianças abandonadas, 1876
A prática de exposição/rejeição de recém-nascidos perde-se no tempo, sempre aliada ao fenómeno do infanticídio, e as suas causas diversificadas foram-se modificando, se bem que alguns motivos passam a assumir mais incidência consoante os diversos contextos espácio-temporais. Ao mesmo tempo, autoridades religiosas e civis da Europa medieval tentaram encontrar formas de responder a esse flagelo social. O problema dos expostos e a criação de casas específicas para o seu cuidado. Contudo, é a “circular de 24-03-1783 no reinado de D. Maria I, que marca a implementação das casas da Roda por todo o país e determinou « Que em todas as cidades e vilas do reino» houvesse Casa da Roda, em lugar discreto, onde devia haver uma rodeira. Assim o documento do mês, desvela a partir das guias de crianças abandonadas todo o processo pelo qual eram acompanhadas, evidenciando tal realidade. De salientar a descrição dos “bens” que as acompanhavam, tais como, camisas ,lençóis etc.
As rodas tinham formas próprias de funcionamento. A mãe ou a pessoa que ela indicasse, colocava a criança no recetáculo, rodava-o, e dava um sinal (pancadas leves na roda ou na porta) para avisar que estava um bebé na roda. A criança, por vezes, trazia um bilhete que era arquivado junto ao registo, ou transcrito para o registo de matrícula, com os seus dados pessoais mais básicos. A rodeira recolhia a criança, dava-lhe os cuidados de higiene e alimentação e só depois se procedia ao seu registo. O registo era feito num papel impresso, onde se ficava a saber quando foi apresentada a matrícula, quais os sinais que apresentava, se trazia indicação do nome; se era ou não batizada, o nome que lhe era dado, a ama a quem era entregue e residência, e ainda o registo dos objetos que a acompanhavam em termos de enxoval, quando era “entregue à mãe”, se “terminou o tempo”, ou se “morreu na roda”. No dia seguinte era visto pelo médico municipal. Caso estivesse bem de saúde podia ser entregue à ama, se estava doente permanecia na Roda. Os expostos eram entregues a amas de leite (menos de um ano e meio) ou amas-secas (mais de um ano e meio) e aí permaneciam até aos 7 anos, mediante um vencimento pago pela Câmara Municipal. Entre os 7 e os 12 anos fazia-se a integração social da criança exposta.
Estas guias e documentos de crianças abandonadas, impele-nos a uma profunda reflexão que é verdadeiramente atual. Basta olhar o mundo que nos rodeia e do qual participamos para não nos esquecermos que a história é um livro aberto pelo qual devemos ler e aprender num contínuo processo de aprendizagem e aperfeiçoamento. Eis a lição que todos devemos aprender no intimo da nossa humanidade, preservar o nascimento.